Tesouro da Juventude
O Tesouro da Juventude, editado por W. M. Jackson, Inc., com sede em São Paulo, era obra originalmente inglesa. Caracterizava-se assim:
Encyclopedia em que se reunem os conhecimentos que todas as pessoas cultas necessitam possuir, offerecendo-os em forma adequada para o proveito e entretimento (sic) dos meninos.
Com introdução de Clovis Bevilaqua, para atestar a qualidade, possuia um texto admirável, e a seleção de temas e autores apontava para uma comissão editorial, de constituição não revelada, de alta categoria. Aqui vamos nos ater ao seu Livro dos Porquês, uma seção, presente em todos os 18 volumes, de perguntas e respostas, quase sempre sobre temas científicos.
Ao citarmos o Thesouro da Juventude estaremos usando a ortografia da época.
Perguntas do Tesouro da Juventude
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De que é feito o Sol?
Ainda não ha muitos annos, seriamos obrigados a dizer, segundo a opinião geral, que era impossivel responder a esta pergunta. Ninguem suspeitava então que expondo um prisma de crystal á luz do sol e observando o aspecto dos raios depois de o terem atravessado, se podia determinar com toda a segurança os elementos chimicos que se encontram no sol, no ponto donde provem a luz. Estudando-se a luz solar d'este modo, podia-se-nos ter revelado na superficie do sol a existencia de corpos completamente differentes dos elementos conhecidos na terra; mas o caso é que actualmente temos provas, que não deixam duvidas, que o sol é composto dos mesmos elementos que entram na composição da terra e na do nosso proprio corpo, ou seja, substancias como o carbono, o oxygenio, o calcio, o ferro e muitas outras.
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Conhece-se alguma especie de materia que não se encontre na terra?
Segundo o que o espectroscopio nos revelou, existe no sol um elemento que não se encontra no nosso planeta; foi observado pela primeira vez na parte do sol que se chama a "coroa", dando-se, por isso, o nome de "coronio". Até hoje ainda não se encontrou este elemento em parte alguma da terra. Tambem se descobriu no sol outro elemento conhecido com o nome de "helio", palavra derivada do vocabulario grego "helios" que significa sol; mas alguns anos depois de ter sido observado no sol, esse mesmo elemento foi encontrado na terra, na forma de um mineral muito raro; e, actualmente, sabe-se que o (elemento) radio o produz continuamente. Do mesmo modo que averiguámos que elementos formam o sol, podemos chegar a saber, por meio do estudo da luz que as estrellas emittem, de que se compõem estes astros, situados a tão enorme distancia de nós.
O corônio não existe, é claro. A coroa solar é observada durante os eclipses, situação em que a análise espectral é muito delicada, principalmente pela breve duração da medida. A hipótese do corônio, foi, porém, fértil. Motivava o envio de grandes equipes científicas aos locais onde o eclipse seria total, com equipamentos cada vez melhores. Em um desses eclipses detetou-se o desvio da luz pelo campo gravitacional do Sol, previsto pela teoria da relatividade geral, de Einstein. Isto foi em 1919, e aí começou a enorme fama de Einstein. O hélio é, na verdade, o segundo elemento mais abundante no universo, sendo também um dos componentes da atmosfera terrestre.
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Poderemos transportar-nos um dia a outro planeta?
Um dos homens mais illustres que teem existido disse que os verdadeiros ignorantes eram os que se supunham sufficientemente sabios para affirmar que os homens nunca poderiam fazer ou descobrir esta ou aquella cousa; e a historia dos conhecimentos humanos deu-lhe razão. Comtudo, mesmo sem nos esquecermos d'estas palavras inclinamo-nos a crer que a resposta deve ser absolutamente negativa. Julio Verne escreveu uma historia engenhosa e interessante de uns homens que foram lançados á lua dentro de um volumoso projectil de canhão; mas nem mesmo nos nossos dias isto é possivel. E esta historia refere-se á lua que só dista de nós 444.480 kilometros; emquanto todo o systema solar teria que mudar muito para que a terra chegasse a encontrar-se a menos de 37.040.000 kilometros de outro planeta qualquer. Não existe força alguma capaz de enviar a semelhante distancia um projectil, mesmo suppondo que pudesse estar certa a pontaria da peça que o lançasse, e que as pessoas que fossem dentro delle pudessem resistir ao tremendo choque que experimentariam no momento em que a peça disparasse. Mas supponhamos que os homens inventavam um apparelho que produzisse a força no seu interior, uma machina de voar extraordinária. A principal difficuldade estaria em que, a uma certa altura, embora os aviadores levassem muita provisão de ar para respirar ou os meios de o fabricarem, o propulsor do apparelho não teria ar em que se apoiasse. No vacuo, nem a ave mais vigorosa poderia aguentar, e o mesmo aconteceria com o homem que pretendesse nadar ou conservar-se ao nivel das bordas num tanque sem agua. Mas supponhamos tambem que esta difficuldade não existia; mesmo assim, ainda se topava com outra insuperavel. Os aviadores teriam que navegar muitos milhões de kilometros atravez do espaço gelado. Ninguem pode imaginar o frio horrivel que reina nessas regiões; basta, porém, dizer que a permanencia de uns tantos minutos apenas nellas, gelaria os nossos corpos, privando-os da vida. Embora se dirigissem a Marte com a velocidade da luz--o que podemos affirmar que os homens jamais conseguirão--morreriam antes de chegar a este planeta.
Curiosamente, o argumento final, considerado insuperável, é o do frio, que, levando uns poucos minutos para matar por congelamento, exigiria que a viagem se realizasse nesses poucos minutos. Não creio que essa dificuldade teria sido considerada muito forte pelos esquimós! (Oops, politicamente incorreto: deve-se dizer inuits).
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Podemos algum dia nos communicar com outro planeta?
Esta pergunta differe essencialmente da anterior. Antes de mais nada, é preciso dar como assente que, em outro planeta, em Marte, por exemplo, ha seres dotados de intelligencia, o que é bastante verosimil. Se isto é assim, não há razão para que não possamos communicar com elles de algum modo. É claro que terão de começar pro apprender a interpretar o que lhes queremos dizer; mas isto não constituiria uma difficuldade tão insuperavel, como a que a transmissão do som representa. Em França está reservado um grande premio para a primeira pessoa que estabeleça a communicação com qualquer planeta, e talvez chegue o dia em que alguem o ganhe. Se em Marte ha seres intelligentes, é provavel que sejam muito mais instruídos que nós, porque Marte é um mundo muito mais antigo que o nosso, e por consequencia os seus habitantes tem tido mais tempo para se instruir e aperfeiçoar. É possivel que, ha já muitos seculos, estejam tratando de chamar a attenção para elles, e que esperem, com anciedade (sic), o momento em que os habitantes da terra se tornem sufficientemente intelligentes para os poderem comprehender. Até se tem chegado a insinuar, embora não muito a serio, que o grande systema de canaes que se observa no referido planeta -- ecujas dimensões são bastante grandes para podermos ler nelles -- são certos caracteres gigantescos, de uma escripta especial com a qual os marcianos pretendem enviar-nos alguma mensagem. Seja como for, estes canaes demonstram que a communicação entre Marte e a terra está muito longe de ser impossivel; e, se os seus habitantes possuissem telescopios tão bons como os nossos, poderiam, sem duvida ler qualquer mensagem que lhes escrevessemos com caracteres gigantescos no deserto do Sahará ou na Siberia.
Obviamente não havia ainda o rádio, nessa época; a comunicação interplanetária teria de ser ... por carta!
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Qual é a natureza dos anéis de Saturno?
Alguns dos aneis do planeta Saturno são escuros e outros são claros e apresentam-se no campo do telescópio como se fossem formados por uma substancia solida e sem solução alguma de contnuidade, como um anel de nupcias. Um homem illustre, muito dado ao estudo da natureza , demonstrou que não podiam ser feitos de qualquer materia solida e continua, porque então não tinham podido formar-se, e, caso isto tivesse sido possivel, haviam necessariamente de quebrar. Porém, aneis que duram ha tanto tempo, como os de Saturno, deviam ser formados por grande numero de pequenas partes, como calhaus, por exemplo, e é esta presentemente a melhor resposta que podemos dar a esta pergunta.
O homem ilustre, muito dado ao estudo na natureza, era James Clerk Maxwell, de fama eletromagnética
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O que é o vacuo?
No estudo da Natureza faz-se um uso frequente da palavra vacuo, para significar a ausencia absoluta de toda a materia numa porção de espaço considerada; comtudo, devemos ter presente que, na realidade, o vacuo absoluto não existe, pois aquillo a que chamamos ether encontra-se por toda a parte. Esta palavra vacuo é derivada do adjectivo latino vacuum, que tem a mesma significação; a nossa lingua possue tambem outra palavra: vazio, que tambem deriva do adjectivo latino, embora tenha soffrido uma alteração maior. Quando, porém, falamos do vacuo, não levamos o ether em linha de conta, e referimo-nos unicamente aos gazes, taes como o ar. Tomemos um balão de vidro, que não se amachuca quando se faz o vacuo dentro d'elle, como aconteceria com um cartucho de papel, que seria achatado pela pressão atmospherica exterior, se nelle pretendessemos fazer o vacuo, e appliquemos-lhe uma bomba com o fim de extrahir o ar que tem dentro. Quando o tivermos conseguido, diremos que fizemos o vacuo no interior do balão. É evidente que, mesmo não contando com o ether, nunca se pode obter o vacuo absoluto, mas unicamente um espaço que contenha relativamente pouco ar. Se pudessemos dispor de uma bomba que não tivesse escape algum--o que até agora não tem sido possivel construir-- e a fizessemos funccionar pelo espaço de mil annos, jamais conseguiríamos extrahir todo o ar que existe no interior do globo, nem obter nelle um vacuo perfeito.
Por que, uai? (Explicação a seguir)
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Por que não é possivel obter um vacuo perfeito?
Ha quem creia que, se continuassemos a applicar a bomba durante o tempo necessario, conseguiriamos, por fim, obter um vacuo perfeito; mas não é assim. Supponhamos mesmo que tinhamos uma bomba perfeita e que, em cada movimanto do embolo, conseguiamos extrahir metade do ar que existe dentro do globo. Depois do primeiro movimento do embolo, tinhamos extrahido metade do ar total; depois do segundo, as as tres quartas partes do mesmo, depois do terceiro, os sete oitavos; depois do quarto, os quinze dezesseis avos, etc., de modo que ficará sempre algum ar lá dentro. Ninguem poude nem jamais poderá fazer em sitio algum um vacuo perfeito. Alem da machina pneumatica, há outros processos de fazer o vacuo, mas nenhum delles é perfeito, embora algum seja superior ao da referida machina.
O paradoxo de Zenão aplicado aos gases! A "demonstração" demonstra que nenhum meio contínuo pode ser esvaziado!